Grupo de estudos em filosofia do Centro Universitário Municipal de São José - USJ vinculado ao LEFIS/UFSC e ao programa CIVILIZAÇÃO da FAED/UDESC.
domingo, 29 de maio de 2011
Fotos de alguns participantes da Oficina Kantiana - 28/05/2011
quinta-feira, 26 de maio de 2011
Estética Transcendental - O Espaço
Kant aborda vários conceitos, como já visto nas postagens anteriores, que devem ser bem compreendidos para concebermos de forma mais precisa o que está sendo demonstrado como um todo. Neste intento, exporemos, a partir do capítulo "Estética Transcendental do Espaço" da "Crítica da Razão Pura", alguns conceitos chaves para compreensão da sua obra.
Assim, podemos iniciar abordando a sensibilidade que é "a capacidade de receber (a receptividade) representações dos objetos segundo a maneira como eles nos afetam [...]" (p. 15) Não confundamos sensibilidade, com sentidos, pois a sensibilidade é "a priori", faz parte da razão pura, é quem dá a forma aos objetos, pois dela fazem parte o espaço (perspectiva) e o tempo (existência). "[...] mas é pelo entendimento que elas (intuições) são pensadas, sendo dele que surgem os conceitos." (p. 15) [grifo meu], o entendimento também é outra parte da razão pura, e da mesma forma que da sensibilidade fazem parte o espaço e o tempo, do entendimento fazem parte as categorias (quantidade, qualidade, relação e modalidade) para conceituação dos objetos.
"Todo pensamento deve em última análise, seja direta ou indiretamente, mediante certos caracteres, referir-se às intuições, e, conseguintemente, à sensibilidade, porque de outro modo nenhum objeto nos pode ser dado." (p. 15), entende-se por intuição a espacialidade (tridimensionalidade) dos objetos e como o espaço faz parte da sensibilidade é por essa maneira que os objetos, enquanto espaciais, nos são apresentados, por algo que está dentro de nós mesmos, pois nós, enquanto seres humanos, somos dotados da sensibilidade em nossa razão e assim pomos a espacialidade nos objetos e os representamos em perspectivas. Por exemplo, em uma pintura, sabemos que é feita em 2D (bidimensional - altura e largura) não há profundidade, então como somos capazes de perceber a profundidade naquilo que não há? Justamente pela nossa intuição que está na sensibilidade espacial da nossa razão pura. Eis um exemplo:
Pintura em 2D |
O espaço (extensão) é (apenas) a forma pura da sensibilidade |
"A impressão de um objeto sobre esta capacidade de representações, enquanto somos por ele afetados, é a sensação." (p. 15) Outro ponto importante é a sensação, pois esta é a impressão que temos dos objetos, está vinculada a experiência e é portanto "a posteriori".
"Chama-se empírica toda intuição que relaciona ao objeto, por meio da sensação." (p. 15) Intuição empírica está relacionada ao objeto e consequentemente a sensação que o objeto nos causa, pois não só depende do espaço da nossa sensibilidade como depende do objeto para lhe causar uma sensação.
"O objeto indeterminado de uma intuição empírica, denomina-se fenômeno." (p. 15) O fenômeno é a representação da minha sensibilidade no objeto que foi anteriormente por ele afetada (sensação), não confunda-se fenômeno com o objeto em si, por ser ele apenas a representação do que é para nós.
"No fenômeno chamo matéria àquilo que corresponde à sensação; aquilo pelo qual o que ele tem de diverso pode ser ordenado em determinadas relações, denomino “forma do fenômeno”. Como aquilo mediante o qual as sensações se ordenam e são suscetíveis de adquirir certa forma não pode ser a sensação, infere-se que a matéria dos fenômenos só nos pode ser fornecida “a posteriori”, e que a forma dos mesmos deve achar-se já preparada “a priori” no espírito para todos em geral, e que por conseguinte pode ser considerada independentemente da sensação." (p. 15) O fenômeno é portanto um misto de matéria (sensação - "a posteriori") e forma (independe da sensação - "a priori"), a matéria está relacionada ao que ele "é" enquanto objeto físico e a forma é a capacidade da sensibilidade de raciocinar este objeto como algo espacial, tridimensional.
"Toda a representação na qual não há traço daquilo que pertence à sensação chamo pura (em sentido transcendental). A forma pura das intuições sensíveis em geral, na qual todo o diverso dos fenômenos é percebido pela intuição sob certas relações, encontra-se “a priori” no espírito. Esta forma pura da sensibilidade pode ainda ser designada sob o nome de intuição pura. Assim, quando na representação de um corpo eu me abstraio daquilo que a inteligência pensa, como substância, força, divisibilidade etc., bem como daquilo que pertence à sensação, como a impenetrabilidade, a dureza, a cor etc., ainda me resta alguma coisa desta intuição empírica, a saber: a extensão e a figura. Estas pertencem à intuição pura, que tem lugar “a priori” no espírito, como uma forma pura da sensibilidade e sem um objeto real do sentido ou sensação." (p. 15) Toda representação que não depende dos fenômenos, ou seja, da sensação para nos afetar, mas se encontra puramente na nossa razão, denomina-se intuição pura, diferente da intuição empírica que necessita que o objeto forneça a sensação para afetar a sensibilidade. Foi dito anteriormente que a forma não depende da sensação e é portanto "a priori", conseguinte se tirarmos a impenetrabilidade, a dureza, a cor que pertencem ao fenômeno, resta-nos a forma pura, que não está relacionada a sensação, mas a sensibilidade da razão ("a priori") e assim a denominamos intuição pura. Portanto a forma pura da sensibilidade é a intuição pura, ou seja, o espaço. Ou melhor a extensão e a figura que se revelam em minha razão "a priori".
"Denomino Estética transcendental à ciência de todos os princípios “a priori” da sensibilidade. É pois esta ciência que deve constituir a primeira parte da teoria transcendental dos elementos, por oposição àquela que contém os princípios do pensamento puro e que se denominará Lógica transcendental." (p. 16) Os princípios "a priori" da sensibilidade a que Kant se refere são o espaço (intuição pura) e o tempo.
"Na Estética transcendental, nós começaremos por isolar a sensibilidade, fazendo abstração de tudo quanto o entendimento aí acrescenta e pensa por seus conceitos, de tal sorte que só fique a intuição empírica. Em segundo lugar, separaremos, também, da intuição tudo o que pertence à sensação, com o fim de ficarmos só com a intuição pura e com a forma do fenômeno, que é a única coisa que a sensibilidade nos pode dar “a priori”. Resultará desta pesquisa que existem duas formas puras da intuição sensível, como princípios do conhecimento “a priori”, a saber: o espaço e o tempo, de cujo exame vamos agora ocupar-nos." (p. 16) Fazem parte da nossa razão pura, a sensibilidade (espaço e tempo) e o entendimento (categorias), como abordado anteriormente, desta forma, se isolo a sensibilidade do entendimento, abstraindo-a das categorias resta-nos a intuição empírica, por ainda depender da sensação, mas se isolarmos a intuição empírica da sensação resta-nos a intuição pura, o espaço e o tempo que são as formas puras da intuição sensível (sensibilidade).
O espaço é uma dada grandeza infinita, o ser humano é finito, assim apreende uma parte do espaço (o que já é necessário para pôr espacialidade nos fenômenos), porém os fenômenos são representados apenas para nós, e não como o objeto em si.
"Por meio dessa propriedade de nosso espírito que é o sentido externo, nós nos representamos os objetos como estando fora de nós e colocados todos no espaço." (p. 16) Porém os objetos enquanto nos parecem ser algo puramente externo, na verdade são uma participação da espacialidade que há dentro da nossa razão.
"O tempo não pode ser percebido exteriormente, assim como o espaço não pode ser considerado como algo interior em nós outros." (p. 16) Sendo o espaço, uma dada grandeza infinita, o ser humano é participante desta grandeza, enquanto "pedaços", pois o espaço não é um conceito, mas algo tão grande que é apenas absorvido em partes, e isso não afeta a espacialidade que a nossa sensibilidade coloca nos fenômenos.
"Entendo por exposição a clara representação (ainda que não seja extensa) do que pertence a um conceito; a exposição é metafísica quando contém o que o conceito apresenta como dado “a priori”." (p. 16) A exposição pertence ao conceito e consequentemente são "trabalhados" a sensibilidade (tempo e espaço) "a priori", o entendimento (categorias) "a priori" e a sensação "a posteriori", mas enquanto exposição metafísica está relacionada apenas a razão pura (sensibilidade e entendimento) "a priori". A exposição e a exposição metafísica estão sendo abordadas para que possamos compreender mais à frente sobre o realismo empírico e o idealismo transcendental.
"O espaço não é um conceito empírico, derivado de experiências exteriores. Com efeito, para que eu possa referir certas sensações a qualquer coisa de exterior a mim (quer dizer, a qualquer coisa colocada em outro lugar do espaço diverso do que ocupo), e, para que possa representar as coisas como de fora e ao lado umas das outras, e por conseguinte como não sendo somente diferentes, mas colocadas em lugares diferentes, deve existir já em princípio a representação do espaço. Esta representação não pode, pois, nascer por experiência das relações dos fenômenos exteriores, sendo que estas só são possíveis mediante a sua prévia existência." (p. 16 e 17) O espaço não depende da experiência "a posteriori", por não ser empírico, pois a representação espacial não nasce na experiência, mas mediante a prévia existência do espaço na sensibilidade da razão pura "a priori", quase que como algo inato ao ser humano, lembrando que os conhecimentos "a priori" se originam na experiência, mas dela não dependem. Assim podemos pressupor que no momento do nascimento, temos contato com a experiência e que a partir daí podemos pelo que há de puro em nossa razão conhecer os fenômenos.
"O espaço é uma representação necessária, “a priori”, que serve de fundamento a todas as intuições externas. É impossível conceber que não exista espaço, ainda que se possa pensar que nele não exista nenhum objeto. Ele é considerado como a condição da possibilidade dos fenômenos, e não como uma representação deles dependente; e é uma representação “a priori”, que é o fundamento dos fenômenos externos." (p. 17) O espaço é "a priori" por não depender dos fenômenos, mas por ser a condição da possibilidade do fenômeno enquanto algo espacial. O espaço é o fundamento dos fenômenos externos, é o que os faz ser representados para nós.
"[...] se segue que o que serve de base a todos os conceitos que temos do espaço, é uma intuição “a priori” (que não é empírica)." "A primitiva representação do espaço é, pois, uma intuição “a priori” e não um conceito." (p. 17) Portanto o espaço é intuição "a priori", ou seja, intuição pura.
"Entendo por exposição transcendental a aplicação de um conceito, como princípio que pode mostrar a possibilidade de outros conhecimentos sintéticos “a priori”. Ora, isso supõe duas coisas:
1 — que realmente emanem do conceito dado tais conhecimentos;
2 — que esses conhecimentos não sejam possíveis senão sob a suposição de um modo de explicação dado e tirado desse conceito." (p. 17)
"Mas essa intuição deve achar-se em nós, “a priori”, quer dizer, anteriormente a toda percepção de um objeto, e, por conseguinte, ser pura e não empírica." (p. 18)
"Como se encontra, pois, no espírito, uma intuição externa anterior aos mesmos objetos e na qual o conceito desses objetos pode ser determinado “a priori”? Isso só pode acontecer sob a condição de que ela tenha sua sede no sujeito, com a capacidade formal que ele tem de ser afetado por objetos e de receber assim uma representação imediata, quer dizer, uma intuição, por conseguinte como forma do sentido exterior em geral." (p. 18)
O sujeito é afetado pelo objeto através da sensação e assim recebe uma representação (intuição imediata), assim há uma troca de representações e o objeto não se mostra como tal, mas apenas como uma representação da nossa sensibilidade. Sabe-se que para Kant, o objeto e o sujeito em si não são passíveis de conhecimento, mas temos apenas uma representação do objeto como ele se mostra a nós (REALISMO EMPÍRICO) e do sujeito como consciência da sensibilidade - espaço e tempo (IDEALISMO TRANSCENDENTAL).
Para melhor compreensão da representação, veja a imagem abaixo:
Representação |
"O espaço não é mais do que a forma dos fenômenos dos sentidos externos, quer dizer, a única condição subjetiva da sensibilidade, mediante a qual nos é possível a intuição externa." (p. 18) Só podemos conceber a espacialidade dos fenômenos, mediante a forma que deles há na sensibilidade. Entenda-se forma, como não-matéria, pois enquanto para Aristóteles era possível conhecer a coisa em si (substância = matéria + forma), para Kant este conhecimento não é possível, apesar de termos a forma como causa eficiente do fenômeno.
"E como a propriedade do sujeito de ser afetado pelas coisas precede necessariamente a todas as intuições das mesmas, compreende-se facilmente que a forma de todos os fenômenos pode achar-se dada no espírito antes de toda percepção real, e, consequentemente, “a priori”. Mas como seja uma intuição pura onde todos os objetos devem ser determinados, ela pode conter anteriormente a toda experiência os princípios de suas relações." (p. 18) Assim a forma dos fenômenos está no sujeito antes mesmo da percepção real (empírica).
"Nosso exame do espaço mostra-nos a sua realidade, quer dizer, o seu valor objetivo relativamente a tudo aquilo que se pode apresentar-nos como objeto; mas ao mesmo tempo, também, a idealidade do espaço relativamente às coisas consideradas em si mesmas pela razão, quer dizer, sem atender à natureza de nossa sensibilidade. Afirmamos, pois, a realidade empírica do espaço em relação a toda experiência externa possível; mas reconhecemos também a idealidade transcendente do mesmo, quer dizer, a sua não existência, desde o momento em que abandonamos as condições de possibilidade de toda experiência e cremos seja ele algo que serve de fundamento às coisas em si." (p. 19) Ou seja, os objetos enquanto fenômenos são reais por serem empíricos (REALISMO EMPÍRICO), mas sabendo que os fenômenos são concebidos a partir da sensibilidade (espaço e tempo) abandonamos a experiência e cremos na sua idealidade como fundamento básico para a representação dos fenômenos (IDEALISMO TRANSCENDENTAL).
"Neste último caso, com efeito, aquilo que não é originariamente senão um fenômeno, por exemplo, uma rosa tem, no sentido empírico, o valor de uma coisa em si, se bem que, quanto à cor, possa aparecer diferente aos diferentes olhos. Pelo contrário, o conceito transcendental dos fenômenos no espaço nos sugere esta observação crítica, de que em geral nada do que é intuído no espaço, é coisa em si; e, ainda, que o espaço não é uma forma das coisas consideradas em si mesmas, mas que os objetos não nos são conhecidos em si mesmos e aquilo que denominamos objetos exteriores consiste em simples representações de nossa sensibilidade cuja forma é o espaço, mas cujo verdadeiro correlativo, a coisa em si, permanece desconhecida e incognoscível, jamais sendo indagada da experiência." (p. 19) Desta forma, nada que é intuído do espaço é coisa em si, os objetos exteriores são simples representações de nossa sensibilidade, cuja forma é o espaço, mas a coisa em si não pode ser conhecida.
Fotos de alguns participantes da Oficina Kantiana - 07/05/2011
Da esquerda para a direita Prof. Msc. Evandro, Acadêmicos de CR Valmir e Rafael |
Da esquerda para a direita Prof. Msc. Evandro e Acadêmica de CR Solange |
Da esquerda para a direita Evandro, Rudi, Solange, Luciana, Adão, Valmir e Rafael |
sábado, 14 de maio de 2011
A vida de Immanuel Kant
Nascido numa pequena cidade da Prússia, Konigsberg, atual Kalinigrado, no dia 22 de abril de 1724, Kant foi o quarto dos nove filhos de Regina e Johann Georg Kant, artesão humilde, que trabalhava com artigos de couro. Nascido numa família protestante (Luterana), teve uma educação austera numa escola pietista, que frequentou graças à intervenção de um pastor. Ele próprio foi um cristão devoto por toda a sua vida. Passou grande parte da juventude como estudante, sólido mas não espetacular, preferindo o bilhar ao estudo. Tinha a convicção curiosa de que uma pessoa não podia ter uma direção firme na vida enquanto não atingisse os 39 anos. Com essa idade, era apenas um metafísico menor numa universidade prussiana, mas foi então que uma breve crise existencial o assomou. Pode argumentar-se que teve influência na posterior direção. Estudou no Colégio Fridericianum e na Universidade de Konigsberg; nesta última tornou-se professor catedrádico, depois de alguns anos como preceptor de filhos de famílias ricas.
Kant foi um respeitado e competente professor universitário durante quase toda a vida, mas nada do que fez antes dos 50 anos lhe garantiria qualquer reputação histórica. Viveu uma vida extremamente regulada: o passeio que fazia às 15:30 todas as tardes era tão pontual que as mulheres domésticas das redondezas podiam acertar os relógios por ele.
Kant não casou nem teve filhos. Faleceu a 12 de fevereiro de 1804, sem jamais ter saído da cidade em que nasceu. Era um homem extremamente metódico, de pequena estatura e físico frágil.
Outros acontecimentos relatados sobre sua vida (a impressão causada pela leitura das obras de David Hume (1711-1776), a admiração incontida pelo pensamento de Rousseau (1712-1778), a timidez ao proferir a primeira aula) são todos os episódios com um único denominador comum: um cérebro que passou a vida investigando o universo espiritual do homem, à procura de seus fundamentos últimos, necessários e universais.
Por volta de 1770, com 46 anos, Kant leu a obra do filósofo escocês David Hume. Hume é por muitos considerados um empirista ou um cético, muitos autores o consideram um naturalista. Kant sentiu-se profundamente inquietado. Achava o argumento de Hume irrefutável, mas as conclusões inaceitáveis. Durante 10 anos não publicou nada e, então, em 1781 publicou o massivo "Crítica da Razão Pura", um dos livros mais importantes e influentes da moderna filosofia.
Ponto de convergência do pensamento filosófico anterior, a obra de Kant constitui, ao mesmo tempo, fonte da qual brota a maior parte das reflexões dos séculos XIX e XX. Neste livro (Crítica da Razão Pura), ele desenvolveu a noção de um argumento transcendental para mostrar que, em suma, apesar de não podermos saber necessariamente verdades sobre o mundo "como ele é em si", estamos forçados a percepcionar e a pensar acerca do mundo de certas formas: podemos saber com certeza um grande número de coisas sobre "o mundo como ele nos aparece". Por exemplo, que cada evento estará causalmente conectado com outros, que aparições no espaço e no tempo obedecem a leis da geometria, da aritmética, da física, etc.
A Crítica da Razão Pura se situa em permanente discussão com seus predecessores mais ilustres - Descartes, Leibniz, Spinoza... -, bem como com seus contemporâneos, a começar por Hume. É impossível ler adequadamente Nietzsche, Husserl, Heidegger ou Arendt sem ter uma boa compreensão da Crítica da Razão Pura.
Nos cerca de vinte anos seguintes, até a morte em 1804, a produção de Kant foi incessante. O seu edifício da filosofia crítica foi completado com a Crítica da Razão Prática, que lidava com a moralidade de forma similar ao modo como a primeira crítica lidava com o conhecimento; e a Crítica do Julgamento ou do Juízo, que lidava com os vários usos dos nossos poderes mentais, que não conferem conhecimento factual e nem nos obrigam a agir: o julgamento estético (do Belo e Sublime) e julgamento teleológico (Construção de Coisas Como Tendo "Fins"). Como Kant os entendeu, o julgamento estético e teleológico conectam os nossos julgamentos morais e empíricos um ao outro, unificando o seu sistema.
Uma das obras, em particular, atinge hoje em dia grande destaque entre os estudiosos da filosofia moral. A Fundamentação da Metafísica dos Costumes é considerada por muitos filósofos a mais importante obra já escrita sobre a moral. É nesta obra que o filósofo delimita as funções da ação moralmente fundamentada e apresenta conceitos como o "Imperativo categórico" e a "Boa vontade".
Os trabalhos de Kant são a sustentação e ponto de início da moderna filosofia alemã; como diz Hegel, frutificou com força e riqueza só comparáveis à do socratismo na história da filosofia grega. Fitche, Hegel, Schelling, Schopenhauer, para indicar apenas os maiores, inscrevem-se na linhagem desse pensamento que representa uma etapa decisiva na história da filosofia e está longe de ter esgotado a sua fecundidade.
Kant escreveu alguns ensaios medianamente populares sobre história, política e a aplicação da filosofia à vida. Quando morreu, estava a trabalhar numa projetada "quarta crítica", por ter chegado à conclusão de que seu sistema estava incompleto; este manuscrito foi então publicado como Opus Postumum. Morrera, como dito anteriormente, em 12 de fevereiro de 1804 na mesma cidade que nascera e permanecera durante toda sua vida.
OBRAS:
1755 - História Geral da Natureza e Teoria do Céu;
1763 - O Único Argumento Possível para uma Demonstração da Existência de Deus;
1766 - Sonhos de um Visionário, Interpretado Mediante os Sonhos da Metafísica;
1770 - Dissertação sobre a Forma e os Princípios do Mundo Sensível e do Mundo Inteligível;
1781 - Crítica da Razão Pura;
1783 - Prolegômenos a Qualquer Metafísica Futura que Possa Vir a Ser Considerada como Ciência;
1785 - Fundamentação da Metafísica dos Costumes;
1770 - Dissertação sobre a Forma e os Princípios do Mundo Sensível e do Mundo Inteligível;
1781 - Crítica da Razão Pura;
1783 - Prolegômenos a Qualquer Metafísica Futura que Possa Vir a Ser Considerada como Ciência;
1785 - Fundamentação da Metafísica dos Costumes;
1786 - Primeiros Princípios Metafísicos da Ciência Natural;
1788 - Crítica da Razão Prática;
1790 - Crítica do Julgamento ou do Juízo ou da Faculdade de Julgar;
1793 - A Religião nos Limites da Simples Razão;
1796 - A Paz Perpétua;
1797 - Doutrina do Direito;
1797 - A Metafísica da Moral;
1798 - Antropologia do Ponto de Vista Pragmático.
Fonte: CHAUÍ, Marilena de Souza. Crítica da Razão Pura. Coordenação Editorial de Janice Florido. Chefe de Arte Ana Suely Dobón. Paginação Nair Fernandes da Silva. Tradução Valerio Rohden e Udo Baldur Moosburger. São Paulo: Ed. Nova Cultural, 1999. Vida e Obra.
1788 - Crítica da Razão Prática;
1790 - Crítica do Julgamento ou do Juízo ou da Faculdade de Julgar;
1793 - A Religião nos Limites da Simples Razão;
1796 - A Paz Perpétua;
1797 - Doutrina do Direito;
1797 - A Metafísica da Moral;
1798 - Antropologia do Ponto de Vista Pragmático.
Fonte: CHAUÍ, Marilena de Souza. Crítica da Razão Pura. Coordenação Editorial de Janice Florido. Chefe de Arte Ana Suely Dobón. Paginação Nair Fernandes da Silva. Tradução Valerio Rohden e Udo Baldur Moosburger. São Paulo: Ed. Nova Cultural, 1999. Vida e Obra.
FERRY, Luc. Uma leitura das três "Críticas". Tradução de Karina Jannini. 2 ed. Rio de Janeiro: ed. DIFEL, 2010. 336 p. Versão brasileira de Luc Ferry do original francês.
KANT, Immanuel. Vida, filosofia e obras. Disponível
em: <http://pt.wikipedia.org/wiki/Immanuel_Kant>. Acesso em: 14 mai. 2011, 10:45:30.
Glossário da Introdução de a "Crítica da Razão Pura"
Iremos, neste glossário, destacar os principais conceitos kantianos para melhor compreensão da Introdução de sua obra, pois a partir do momento que Kant aborda o conceito de uma palavra, no restante da obra ele pressupõe que estamos a par do que já foi conceituado anteriormente, eis algumas palavras:
Conhecimento "a priori" - é todo aquele que é universal e necessário, faz parte da razão pura, se origina na experiência, mas não depende dela.
Conhecimento "a posteriori" - é todo aquele que é contingente (pode ou não pode ser - variável), faz parte da experiência, se origina dela e dela depende.
Juízo analítico "a priori" - é todo juízo (conhecimento) onde o predicado nada acrescenta ao sujeito, mas apenas o explica (analisa) e é também universal e necessário ("a priori").
Juízo sintético "a posteriori" - é todo juízo (conhecimento) onde o predicado acrescenta algo ao sujeito, fazendo assim uma síntese, e são contingentes ("a posteriori") por depender da experiência.
Juízo sintético "a priori" - como demonstrado na postagem anterior, este conhecimento é o tema principal da "Crítica da Razão Pura" não sendo respondida num primeiro momento, apenas demonstrada, ou seja, é sintético porque o predicado acrescenta algo ao sujeito e "a priori" porque não depende da experiência, mas da razão pura.
Assim fecha nosso glossário da introdução, mas quem achar que um conceito ou outro ficou sem explicação, pode comentar e pedir para colocarmos no glossário.
sexta-feira, 13 de maio de 2011
Como é possível um juízo sintético "a priori"?
Sabendo que o principal questionamento abordado na "Crítica da Razão Pura" é justamente em relação aos juízos sintéticos "a priori", iremos apenas esboçar nesta postagem o que pode ser e não conceituar sobre o que ele seja, isso faremos no final da obra.
Portanto o que podemos deixar em princípio sobre o que seja um juízo sintético "a priori" é que "Poder-se-ia em verdade crer, à primeira vista, que a proposição 7 + 5 = 12 é puramente analítica, resultante, segundo o princípio de contradição, do conceito de uma soma de sete e cinco. Mas se a considerarmos com mais atenção, acharemos que o conceito de soma de sete e cinco não contém mais do que a união dos dois números em um só, o que não faz pensar qual seja esse número único que compreenda aos outros dois. O conceito de 12 não é de modo algum percebido só pelo pensamento da união de cinco e sete, e posso decompor todo meu conceito dessa soma tanto quanto quiser, sem que por isso encontre o número 12."
"É preciso, pois, ultrapassar esse conceito recorrendo-se à intuição correspondente a um dos dois números, quiçá aos 5 dedos da mão ou a cinco pontos (como faz Segner em sua Aritmética), e aditar sucessivamente ao conceito sete as cinco unidades dadas na intuição."
"Com efeito, tomo primeiramente o número sete, e auxiliando-me de meus dedos como intuição para o conceito de 5, acrescento sucessivamente ao número 7 as unidades que tive de reunir para formar o 5, e assim vejo surgir o número 12."
"Pela adição de sete e cinco tenho idéia desta soma 7 + 5, é verdade; mas não que esta seja igual ao número 12. A proposição aritmética é, pois, sempre sintética: o que se compreende ainda mais claramente se se tomam números maiores, pois então é evidente que, por mais que volvamos e coloquemos nosso conceito quanto quisermos, nunca poderemos achar a soma mediante a simples decomposição de nossos conceitos e sem o auxilio da intuição."
Desta forma Kant demonstra que a soma não é algo que faz parte dos números 7 e 5, ainda que pensemos que a soma seja implícita aos dois números, assim a própria soma que parecia implícita nos números é algo adicionado (sintético) a estes conceitos para que cheguemos realmente ao número 12, porém os números 5 e 7 serão os mesmos em qualquer lugar do universo e a sua soma também será válida até mesmo na lua, o que os faz ser "a priori" (universais e necessários). Assim se faz uma síntese "a priori" num primeiro momento, pois o conceito de soma é completamente aditado e não pode provir da decomposição do conceito de 5 e 7.
Fonte: KANT, Immanuel. A Crítica da Razão Pura. Introdução.
Juízo analítico "a priori" e juízo sintético "a posteriori"
Os juízos são relações entre o sujeito e o predicado, entende-se por juízo (conhecimento). A relação entre o sujeito e o predicado pode ser feita por análise (quando o predicado pertence ao sujeito e assim nada lhe acrescenta) ou síntese (quando o predicado não pertence ao sujeito e algo é acrescentado).
Juízos analíticos "a priori" e sintéticos "a posteriori" |
Juízos analíticos "a priori" são então aqueles que o predicado nada acrescenta ao sujeito, e "a priori", conforme artigo anterior, porque são universais e necessários, desta forma temos o exemplo do triângulo na imagem acima, mas podemos dar um exemplo duplamente semelhante, tanto para os juízos analíticos como para os juízos sintéticos: Todo corpo possui massa.
Esta sentença demonstra que a massa (predicado) nada acrescentou ao corpo (sujeito), sendo um juízo analítico, pois todo corpo já possui massa, não é preciso expressar por meio da linguagem, assim há um desenvolvimento para explicar o que há no corpo sem nada lhe ser acrescentado. E independente do local que o corpo se encontra no universo ele continuará possuindo massa, pois a partir do momento que o corpo não mais possuí-la, na verdade não será mais um corpo, portanto é necessário e universal ("a priori").
Quanto aos juízos sintéticos "a posteriori" podemos dizer que são aqueles que o predicado acrescenta algo ao sujeito, e temos o exemplo da garrafa verde na imagem acima, mas como explanado acima iremos utilizar um argumento de extrema semelhança ao argumento do juízo analítico. Enquanto no juízo analítico "a priori" dissemos que todo corpo possui massa, no juízo sintético "a posteriori" utilizaremos um exemplo semelhante: Todo corpo é pesado.
Analisemos o seguinte, o predicado (pesado) acrescentou algo ao sujeito (corpo)? Sim, acrescentou porque o peso depende da gravidade, enquanto na terra um corpo pesa xN, na lua o peso diminui porque a gravidade é menor, desta forma há uma variação (contingência) do peso em relação ao corpo ("a posteriori") e por acrescentar algo ao sujeito, ou seja, a gravidade que não faz parte do corpo, o juízo é sintético.
Quanto aos juízos analíticos Kant diz que "[...] seria absurdo fundar um juízo analítico na experiência, pois para formá-lo não preciso sair do meu conceito e por conseguinte não me é necessário o testemunho da experiência. Posso reconhecer antes, analiticamente, o conceito de corpo pelas propriedades da extensão, impenetrabilidade, forma etc., etc., as quais são todas pensadas neste conceito." grifo meu
E quanto aos juízos sintéticos Kant demonstra: "Mas se amplio meu conhecimento e observo a experiência que me proporcionou o conceito de corpo, encontro enlaçada constantemente com todas as anteriores propriedades e de gravidade (o peso), que adito sinteticamente, como predicado, àquele conceito." grifo meu.
Fonte: KANT, Immanuel. A Crítica da Razão Pura. Introdução.
Conhecimento "a priori" e "a posteriori"
Em "A Crítica da Razão Pura" Immanuel Kant aborda alguns aspectos do conhecimento e os distingue, ainda que esta distinção seja feita "mediante uma longa prática que nos habilite a separar esses dois elementos." e os elementos do conhecimento a que Kant se refere são o "a priori" e "a posteriori".
Conhecimento "a priori" e "a posteriori" |
Assim inicia Kant, "No tempo, pois, nenhum conhecimento precede a experiência, todos começam por ela." demonstrando que todo conhecimento inicia com a experiência, porém não é porque iniciou com a experiência que dela deve depender, pois "Consideraremos, portanto, conhecimento “a priori”, todo aquele que seja adquirido independentemente de qualquer experiência. A ele se opõem os opostos aos empíricos, isto é, àqueles que só o são “a posteriori”, quer dizer, por meio da experiência." Desta forma, o conhecimento "a priori" mesmo tendo origem na experiência, não é dependente dela, Kant aborda dizendo que "[...] daqui por diante, [...] conhecimento “a priori”, são todos aqueles que são absolutamente independentes da experiência; eles são opostos aos empíricos, isto é, àqueles que só são possíveis mediante a experiência."
Desta forma o conhecimento "a priori" faz parte da razão pura, e é universal e necessário, como por exemplo: O triângulo possui três lados." Esta frase nos faz entender que em qualquer lugar do universo e em qualquer circunstâncias o triângulo possui três lados, assim como: Todo solteiro é não casado; todo corpo possui massa, ou seja, são casos universais e necessários, sendo o que são em qualquer lugar.
Já o conhecimento "a posteriori" é contingente (pode ou não pode ser), pois depende do fenômeno empírico para ser o que é, dependente da experiência e dela é originado, enquanto o conhecimento "a priori" é originado na experiência, mas não dependente dela.
A separação entre estes dois conhecimentos, um "a priori" (originado na experiência, mas não dependente dela) e um "a posteriori" (que é a própria experiência agindo). "Surge desse modo uma questão que não se pode resolver à primeira vista: será possível um conhecimento independente da experiência e das impressões dos sentidos?"
Lembrando que os conhecimentos "a priori" e "a posteriori" servem apenas para conhecimento das coisas que estão no âmbito da física e não metafísica, e ainda que não podemos conhecer as coisas como são em si, mas apenas como aparecem para nós.
Lembrando que os conhecimentos "a priori" e "a posteriori" servem apenas para conhecimento das coisas que estão no âmbito da física e não metafísica, e ainda que não podemos conhecer as coisas como são em si, mas apenas como aparecem para nós.
Fonte: KANT, Immanuel. A Crítica da Razão Pura. Introdução.
Oficina de leitura kantiana
Os acadêmicos de Ciências da Religião do Centro Universitário Municipal de São José/SC (USJ), com a coordenação do professor mestre de filosofia Evandro O. Brito, participa do grupo de estudos em filosofia vinculado ao LEFIS-SJ (Laboratório Interdisciplinar de Ensino de Filosofia e Sociologia) para debater as obras de Immanuel Kant, iniciamos com "A Crítica da Razão Pura" e pleitearemos pelas outras duas críticas "Crítica da Razão Prática" e "Crítica do Juízo" para chegarmos finalmente no clímax de "A Religião nos Limites da Simples Razão".
Serão abordados neste blog - oficinakantiana.blogspot.com - os principais conceitos postos em discussão nas reuniões do grupo.
Iniciamos os encontros em 2010-2 em salas de aula da USJ com reuniões aos sábados pela manhã e em 2011-1 nossos encontros estão sendo no Bistrô Ateliê Oficina Barroca, situado na Rua Capitão Pedro Leite, 641 - Barreiros, São José-SC, aos sábados, das 15:30 às 18:00hs. Aos que quiserem participar da Oficina de Leitura Kantiana podem entrar em contato com:
Coordenador: Evandro O. Brito - evandrobritobr@yahoo.com.br
Monitor: Rafael Henrique Gomes Botelho - rhenrigb@hotmail.com ou rafahenribotelho@yahoo.com.br
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